segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Ensina-me a voar sobre os telhados de João Tordo

     Opinião: Depois de ter lido o primeiro livro de João Tordo eis que passo diretamente para a sua última obra Ensina-me a voar sobre os telhados.
     O livro, olhando para o título, parece logo de entrada que se trata dum título pouco comercial, muito longo. No entanto, depois de ler a obra compreendemos a escolha do autor e a pertinência do mesmo.
    Este é o tipo de leitura que primeiro se estranha e depois se entranha. Na verdade, quando começamos a leitura dos capítulos, que se alternam, estes surgem-nos como se estivéssemos a ler dois livros, com duas histórias independentes. Eis senão quando, e não vos consigo precisar quando, pois, trata-se de uma conjugação brilhante de construção narrativa, as histórias se interlaçam e tudo faz, naturalmente, sentido.
     As personagens principais são dois homens angustiados pelo seu presente e assombrados pelo seu passado, o que os aproxima e ao mesmo tempo os afasta como forma de sobrevivência. Na verdade, são a demostração de como a tradição, por um lado, e a sociedade e os seus preconceitos, por outro podem condicionar a vida dos seres humanos.
    À volta destas personagens temos toda uma comunidade que se junta no liceu mais antigo de Lisboa, o Liceu Camões, e que partilha, em reuniões mias ou menos espontâneas, as suas angústias, as suas ansiedades e os seus sonhos.
Por outro lado, João Tordo leva-nos a um Japão ancestral que nos surge como uma comunidade estranha, mesmo cruel, onde a tradição e a hereditariedade são bastante importantes na construção das personalidades. Aparece-nos um mundo que esteja a ser vivido e construído no Oriente, ou em Lisboa, torna-se parte integrante das vidas das personagens, condicionando-as e influenciando-as, embora em todo o livro esteja subjacente a ideia de que a vida e a realidade são construídas por cada um e pela sua visão dessa mesma realidade. 
    A tudo isto junta-se uma escrita fabulosa, onde a criatividade e a construão literária se unem com a utilização do vocabulário e das frases de uma forma encantatória, onde o leitor se deixa embalar e levar como se de uma ladainha maravilhosa se tratasse.
    Eis pois um livro, que não sendo uma obra típica de verão, é, sem dúvidas, um dos melhores livros que já li este ano.


   Sinopse: Japão, 1917. Por desonrar o nome da família, o jovem Katsuro é exilado pelo seu próprio pai, um poderoso governador, num ilhéu inóspito. Abandonado, o rapaz irá deparar-se, pela primeira vez, com o terrível segredo da família Tsukuda, enquanto luta para sobreviver à fome, à sede e à culpa.

   Lisboa, cem anos depois. No Liceu Camões, um dos mais antigos da cidade, um professor de Geografia suicida-se numa sala de aula. O nosso narrador, funcionário do liceu e alcoólico em recuperação, decide inaugurar uma reunião semanal para ajudar os colegas a superar o choque.
   Numa noite de Inverno, um misterioso desconhecido aparece no encontro. É japonês e chama-se Tsukuda. O seu estranho comportamento desperta no narrador um fascínio doentio. Ambos são perseguidos pelo passado, ambos desejam o impossível.
   Algures entre o sonho e a mais pura realidade, "Ensina-me a Voar Sobre os Telhados" é um lugar onde um pai e um filho aprendem a amar-se, é um espaço onde se procura aceitar dores antigas e abraçar a fragilidade humana. Um romance que é uma elegia à beleza imperfeita da vida.


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